terça-feira, 10 de novembro de 2009

Gato de botas VS Perdigueiro

Nota: É a mesma situação do conto O Príncipe Sapo: outro ponto de vista. Escrevi esse conto chamado Gato de Botas VS Perdigueiro baseado no conto O Gato de Botas original, que você pode conferir abaixo.



O Gato de Botas






Adaptado do conto de Charles Perrault




Um moleiro, que tinha três filhos, repartindo à hora da morte seus únicos bens, deu ao primogênito o moinho; ao segundo, o seu burro; e ao mais moço apenas um gato. Este último ficou muito descontente com a parte que lhe coube da herança, mas o gato lhe disse:


— Meu querido amo, compra-me um par de botas e um saco e, em breve, te provarei que sou de mais utilidade que um moinho ou um asno. ssim, pois, o rapaz converteu todo o dinheiro que possuía num lindo par de botas e num saco para o seu gatinho. Este calçou as botas e, pondo o saco às costas, encaminhou-se para um sítio onde havia uma coelheira. Quando ali chegou, abriu o saco, meteu-lhe uma porção de farelo miúdo e deitou-se no chão fingindo-se morto. Excitado pelo cheiro do farelo, o coelho saiu de seu esconderijo e dirigiu-se para o saco. O gato apanhou-o logo e levou-o ao rei, dizendo-lhe:


— Senhor, o nobre marquês de Carabás mandou que lhe entregasse este coelho. Guisado com cebolinhas será um prato delicioso.


— Coelho?! — exclamou o rei. — Que bom! Gosto muito de coelho, mas o meu cozinheiro não consegue nunca apanhar nenhum. Dize ao teu amo que eu lhe mando os meus mais sinceros agradecimentos.


No dia seguinte, o gatinho apanhou duas perdizes e levou-as ao rei como presente do marquês de Carabás. O rei ficou tão contente que mandou logo preparar a sua carruagem e, acompanhado pela princesa, sua filha, dirigiu-se para a casa do nobre súdito que lhe tinha enviado tão preciosas lembranças. O gato foi logo ter com o amo:


— Vem já comigo, que te vou indicar um lugar, no rio, onde poderás tomar um bom banho.


O gato conduziu-o a um ponto por onde devia passar a carruagem real, disse-lhe que se despisse, que escondesse a roupa debaixo de uma pedra e se lançasse à água. Acabava o moço de desaparecer no rio quando chegaram o rei e a princesa.


— Socorro! Socorro! — gritou o bichano.


— Que aconteceu? — perguntou o rei.


— Os ladrões roubaram a roupa do nobre marquês de Carabás!


— disse o gato. — Meu amo está dentro da água e sentirá câimbras.


O rei mandou imediatamente uns servos ao palácio; voltaram daí a pouco com um magnífico vestuário feito para o próprio rei, quando jovem.
O dono do gato vestiu-o e ficou tão bonito que a princesa, assim que o viu, dele se enamorou. O rei também ficou encantado e murmurou:


— Eu era exatamente assim, nos meus tempos de moço.


O gato estava radiante com o êxito do seu plano; e, correndo à frente da carruagem, chegou a uns campos e disse aos lavradores:


— O rei está chegando; se não lhes disserem que todos estes campos pertencem ao marquês de Carabás, faço-os triturar como carne para almôndegas. De forma que, quando o rei perguntou de quem eram aquelas searas, os lavradores responderam-lhe:


— Do muito nobre marquês de Carabás.


— Com a breca! — disse o rei ao filho mais novo do moleiro. — Que lindas propriedades tens tu! moço sorriu perturbado, e o rei murmurou ao ouvido da filha:


— Eu também era assim, nos meus tempos de moço.


Mais adiante, o gato encontrou uns camponeses ceifando trigo e lhes fez a mesma ameaça:


— Se não disserem que todo este trigo pertence ao marquês de Carabás, faço picadinho de vocês. Assim, quando chegou a carruagem real e o rei perguntou de quem era todo aquele trigo, responderam:


— Do mui nobre marquês de Carabás.


O rei ficou muito entusiasmado e disse ao moço:


— Ó marquês! Tens muitas propriedades!


O gato continuava a correr à frente da carruagem; atravessando um espesso bosque, chegou à porta de um magnífico palácio, no qual vivia um ogro que era o verdadeiro dono dos campos semeados. O gatinho bateu à porta e disse ao ogro que a abriu:


— Meu querido ogro, tenho ouvido por aí umas histórias a teu respeito. Dize-me lá: é certo que te podes transformar no que quiseres?


— Certíssimo — respondeu o ogro, e transformou-se num leão.


— Isso não vale nada — disse o gatinho. - Qualquer um pode inchar e aparecer maior do que realmente é. Toda a arte está em se tornar menor. Poderias, por exemplo, transformar-te em rato?


— É fácil — respondeu o ogro, e transformou-se num rato.


O gatinho deitou-lhe logo as unhas, comeu-o e desceu logo a abrir a porta, pois naquele momento chegava a carruagem real. E disse:


— Bem vindo seja, senhor, ao palácio do marquês de Carabás.


— Olá! — disse o rei — que formoso palácio tens tu! Peço-te a fineza de ajudar a princesa a descer da carruagem. O rapaz, timidamente, ofereceu o braço à princesa e o rei murmurou-lhe ao ouvido:


— Eu também era assim tímido, nos meus tempos de moço.


Entretanto, o gatinho meteu-se na cozinha e mandou preparar um esplêndido almoço, pondo na mesa os melhores vinhos que havia na adega; e quando o rei, a princesa e o amo entraram na sala de jantar e se sentaram à mesa, tudo estava pronto. Depois do magnífico almoço, o rei voltou-se para o rapaz e disse-lhe:


— Jovem, és tão tímido como eu era nos meus tempos de moço. Mas percebo que gostas muito da princesa, assim como ela gosta de ti. Por que não a pedes em casamento?


Então, o moço pediu a mão da princesa, e o casamento foi celebrado com a maior pompa. O gato assistiu, calçando um novo par de botas com cordões encarnados e bordados a ouro e preciosos diamantes.
E daí em diante, passaram a viver muito felizes. E se o gato às vezes ainda se metia a correr atrás dos ratos, era apenas por divertimento; porque absolutamente não mais precisava de ratos para matar a fome...






Gato de botas VS Perdigueiro




Era uma vez um gato, e ele usava botas. Suas botas eram novas, mas o gato já estava velho, era respeitado no castelo onde morava, na verdade era um senhor, não o senhor absoluto, havia ali apenas um a quem era subordinado. Este era o Rei de Carabás. O rei, se hoje possuía esse título, devia-o ao seu fiel gato que havia ganhado de herança de seu pai.
Acontece que esse rei agora se via em uma situação desconfortável, pois chegará ao seu portão o seu irmão mais velho, que em cólera pedia razões e explicações de tudo que havia se passado com o irmão caçula. Tiveram uma conversa fechada:


Irmão mais velho:


- Rei de Carabá?! Rei de Carabá?! Como rei de Carabá?! Que impropério me provocas! Por quais sortilégios ainda tenho que passar? De um lado um irmão com um asno se torna o burguês mais pomposo do reino, agora aqui chego e descubro que o reino é do mais novo!


Rei de Carabá:


- Sim. E julgas sortilégios o sucesso de teus irmãos? Para mim é uma maravilhosa surpresa saber que nosso irmão está bem. Tu ficas enraivecido com a fortuna dos teus. Diga-me! O que o traz aqui com tanto furor?


Irmão mais velho:


- Pois então lhe digo já! Nosso falecido pai me lança uma traição póstuma, para mim que sou o mais responsável, deixa um moinho sem serventia. Para vocês que sempre foram os beberrões, deixa condições de produção. Agora me diga: O que ele deu sem testamento e em segredo a ti e ao outro, que não puderam compartilhar comigo?


Rei de Carabás:


- Como ousas insultar a memória de nosso pai? Nada ficou oculto em seu inventário. Tudo que ele tinha distribuiu a nós. Se hoje estamos no luxo, é porque soubemos multiplicar os ganhos, se ainda hoje você está somente com aquele moinho, é porque sua imaginação não o move.


Irmão mais velho:


- Então sua imaginação deve ser estupenda. Sim! Pois conseguiu se tornar rei! Vejamos então irmão! Não convém mais discutir. Quero lhe propor um desafio!


Rei de Carabás


- Que desafio?


Irmão mais velho:


- Quero propor-lhe uma disputa! Caçaremos até o dia de amanhã. Aquele que chegar aos portões quando o sol estiver em seu zênite com mais perdizes será o vencedor da contenda. Pode usar o animal que quiser, porém apenas um. Se eu vencer eu fico com o reino.


Rei de Carabás:


- Sonhas? Por que aceitaria? O que eu tenho a ganhar que possa valer mais que o reino?


Com um sorriso macabro o irmão mais velho responde:


- O nosso irmão. Recuse e ele estará perdido. Só eu sei onde ele está.


Estarrecido, o rei de Carabás responde:


- Bastardo! Como... Como ousas ameaçar tal fraticídio?! Você realmente não vale nem o chapéu que nosso pai usava. Maldito!


Irmão mais velho:


- Huahahahahaha! O início vai ser agora. Prepare-se, porque o meu cão, o Perdigueiro, é o melhor cão caçador que se tem notícias, custou-me muito caro, vendi aquele imprestável moinho para comprá-lo. Vejo-te amanhã. Tchauzinho maninho!


O irmão mais velho foi embora. O rei de Carabás em choque, mal podia acreditar no que sucedera. Quem lhe despertou a atenção foi o Gato de Botas, que estava ali escondido.


Gato de Botas:


- Que crápula! Será que não tem vergonha dessa forma vil de conseguir as coisas?


Rei de Carabás:


- Olha quem fala! Huahaahhaua! Mas pelo menos você não ameaçou ninguém de morte.


Gato de botas fala um tanto desconsertado:


- Hu-hum. Bem... Perderemos nosso reino se não fizermos nada. Vamos lá e mostrar para ele que ninguém pode ser um caçador melhor do que eu!


Rei de Carabás entusiasmado:


- É isso! Tenho certeza que você pode caçar mais perdizes do que qualquer canino. Vamos logo!


Pegaram tudo que precisavam e saíram rapidamente. Logo já estavam no bosque rastreando perdizes, mas o gato de botas sabia um jeito melhor de encontrá-los e foi até um ninho onde nunca faltavam. Lá chegando foi surpreendido, o Perdigueiro já estava colocando no saco uma porção de perdizes e disse:


Perdigueiro:


- Prazer! Sou o Perdigueiro e já o conheço. Você é o Gato de Botas. Sabia que sua reputação o precede?


Gato de Botas:


- O prazer é meu Sir Perdigueiro. Sabia que sua reputação não perde para a minha? Só que mentem os boatos, seu focinho é mais eficiente do que reza a lenda.


Perdigueiro:


- Sim, mas não vou ser tolo em superestimar ele, pois se a lenda é verdadeira a seu respeito, precisarei mais do que meu focinho para ajudar meu senhor a vencer esta competição.


Nisso interrompe o irmão mais velho:


- Deixe de trela com esse cuspidor de pêlo, Perdigueiro! Vamos caçar mais perdizes!


E foram bosque à dentro e sumiram de vista. Mas o rei de Carabás ficou muito surpreso com o respeito com que o Gato de Botas e o Perdigueiro se tratavam, certamente seriam grandes rivais. Enfim continuaram a caçar perdizes, mas sempre se repetia a história. Chegavam onde havia perdizes e descobriam que era tarde demais, pois todas as perdizes não estavam mais lá.
Numa dessas, o perspicaz gato achou estranho um aspecto. Não havia penas, sangue, nem marcas de luta pelo chão. O mistério o incomodava. Até que decidiu ir para o lugar mais recôndito da floresta, onde a luz mal penetrava. Mas não sem objeções:


Rei de Carabás:


- Você tem certeza que quer ir para lá? O Pântano Crivado é o pior lugar para se procurar perdizes, aliás, acho que vida alguma reside lá, e os que vão geralmente não voltam.


Gato de Botas:


- Nada temas a não ser o próprio medo, mestre! — exclamou o corajoso felino — Confie em mim.


Então foram. Precisaram de quatro horas para chegar lá, e lá chegando começaram a entrar cada vez mais no coração do Pântano Crivado. Não era fácil andar ali, existiam muitos buracos, e muitos deles cheios de lodo, mas um lodo tal que se alguém pusesse os dois pés ali poderia dar o adeus, pois seria engolido. Porém, o incrível é que o gato parecia saber por onde estava andando, e assim conseguia evitar cada buraco, além dos outros perigos que se apresentavam.
Chegando ao coração do Pântano Crivado, depararam-se com uma imensa árvore morta. Havia ali uma espécie de porta e o gato avançou e arranhou ela. O jovem rei não estava entendendo nada, e passou a entender menos ainda quando um macabro tigre abriu a entrada. Era um tigre velho, com bigodes muito brancos e raros, usava bengala e um chapéu pontudo. E disse com sua voz rouca após ajeitar os óculos que quase pendiam de seu rosto:


- Oh! Mas se meus velhos olhos não me pregam uma peça é o meu afilhado!


Gato de Botas:


- Sim, dindo, ainda podes confiar nos teus olhos, é sim teu afilhado. E trago comigo meu mestre. Mestre, este é o meu dindo, Tigre de Bengala — o Gato de Botas os apresentou — Eu trago ele aqui par...


Enquanto ainda estava falando o Gato de Botas leva uma bengalada na cabeça.


Tigre de Bengala:


- Isso é por vir até aqui, depois de tanto tempo, sem me trazer sequer um daqueles coelhos suculentos que tem no bosque. Agora entrem. Acomodem-se e digam que interesse vocês têm com esse velho.




Entraram onde mais parecia um covil abandonado a séculos do que uma casa na árvore. Lá o jovem rei ficou conhecendo o padrinho do Gato de Botas e passou a entender o porquê do gato ter resolvido falar com tão estranha criatura. Era porque simplesmente o Tigre de Bengala era um excelente alquimista e sabia como preparar uma essência que faria com que todas as perdizes das proximidades fossem atraídas ao sentirem a fragrância exalada pela poção. O tigre, então, preparou a poção para eles. Não cobrou nada além de uma visita mais calma após tudo ter sido resolvido.
Sem mais demoras voltaram para o bosque, já era amanhecer do dia seguinte e o Gato de Botas mal podia esperar para ver a cara do Perdigueiro ao ver eles com tantas perdizes.
Usaram a poção logo, todavia vinham menos perdizes do que esperavam, encheram apenas seis sacos deles. O sol já estava quase em seu zênite quando chegaram no castelo com os seis sacos de perdizes.
Logo chegaram o Perdigueiro e seu senhor, com seis sacos de perdizes também. Contaram as perdizes e ali havia um empate, ambos tinham 128. O gato de botas disse:


- Incrível! Que método você usou para pegá-los?


Perdigueiro:


- Apenas falei com eles, prometi não matá-los e libertá-los após a contagem. Também prometi a eles que se colaborassem entregando onde estavam seus amigos, depois de nos tornarmos senhores do reino, instauraríamos uma lei que proibisse a caça de perdizes para sempre neste bosque. Assim eles colaboraram, teríamos ainda mais se o irmão de seu senhor não matasse os que ele achava no caminho, uma pena... Mas me surpreendo com seu número de perdizes também. Como fez para pegá-los?


Gato de Botas:


- Incrível, estou fascinado com suas astúcias Perdigueiro. Eu contei com a ajuda disto.


Quando o Gato de Botas mostrou o frasco e o abriu, as perdizes vivas que estavam com o Perdigueiro começaram a ir para o lado do Gato de Botas. Eles ficaram apavorados e tentaram agarrar alguns, mas foi em vão, imediatamente depois de alguns já terem mudado de lado, tocou o sino do castelo que anunciava o meio-dia e a troca de turnos dos serviçais, e isso fechou oficialmente a contenda, fazendo com que o Gato de Botas e seu mestre vencessem.
Pularam de alegria os dois parceiros, o rei e seu gato, e o jovem exigiu seu irmão. O irmão mais velho não quis cumprir sua parte no trato e saiu correndo bufando, foi quando o cão Perdigueiro — que depois de saber a verdade arrependera-se de ter ajudado tal crápula, mesmo ele sendo seu amo — o mordeu na perna para evitar que fugisse, embora ele não fosse conseguir ir muito longe, pois após um comando já ensaiado da rainha, que estava ali também, surgiram os guardas reais de vários lugares aos arredores do castelo, onde estavam escondidos. Assim cercaram o covarde e o capturaram, com a ajuda do cão.


A rainha disse:


- Como combinado! Achei que não ia poder participar desse capítulo importante de nosso reino, mas acabei sendo útil, ainda bem.


Rei de Carabá:


- Excelente trabalho, meu amor! Nosso plano deu certo. Agora façam com que confesse onde está o meu irmão.


Perdigueiro:


- Nem precisa, podem mandá-lo direto para a masmorra. Eu mesmo posso informar isso a vocês. Basta que me dêem um objeto que tenha o cheiro dele impregnado.


Aí o rei de Carabás se lembrou de que havia ganhado de presente, certa vez, a moeda da sorte de seu irmão, assim o Perdigueiro cheirou a moeda e foi de encontro ao cativeiro do irmão aprisionado do rei. Eles o acharam em um covil distante, próximo às malocas onde o irmão mais velho morava.
Tudo ficou bem depois, o rei de Carabás libertou as perdizes, adotou o Perdigueiro, nunca mais se esqueceu de pedir notícias ao seu irmão, e este nunca mais deixou passar muito tempo sem visitar seu amado familiar. O irmão mais velho ficou muito, muito tempo aprisionado, até se arrepender do que fizera e ser expulso para muito longe do reino. O Gato de Botas foi visitar novamente o Tigre de Bengala e voltou com outro galo enorme na cabeça, pois mais uma vez esquecerá-se de levar o coelho que o pobre velho tanto gostava.



The End...?

Um comentário:

  1. Bacana a adaptação. Eu não gosto muito do maniqueísmo das histórias infantis, mas confesso que dá uma certa nostalgia :P

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